domingo, 22 de outubro de 2017

Ciclo da Vida

“Pai, meu sonho é entrar em campo com o Cruzeiro”.

Bom, fazia um ano que não dava certo. Por um motivo ou outro, o Cruzeiro entrava em campo e você não. A camisa oficial do ano passado já nem servia mais.

Desta vez era o clássico, e por uma grande sequência de acasos - de ingresso, de entrada no estádio, de pessoas encontradas e ausências de mascotes - conseguimos.

Passamos na loja para comprar uma camisa nova: a de Pentacampeão da Copa do Brasil. "Depois quero colocar o patch de campeão e o escrito De Arrascaeta, porque a camisa é número 10".

Viu o time descer do ônibus, bateu papo com o Raposão e Raposinho, cumprimentou o Fábio, falou rapidamente com o Thiago Neves e entrou em campo com o Rafinha.

Ver a felicidade em seu rosto, a empolgação em seu corpo, a reflexão do Cruzeiro em seu espírito é algo sem preço.

E eu ali, das cadeira te vendo. Os olhos estavam marejados. A minha felicidade era incontida. Eu estava ali, em você, dentro do campo. Eu estava ali quando cantávamos "A imagem do Cruzeiro resplandece".

Ele voltou e vibramos demais com o gol.

O resultado não foi bom. "Pai, deveríamos ter indo embora no final do primeiro tempo. Disso eu não gostei".

Filho, não importa. Somos pentacampeões, somos tetracampeões, somos bicampeões. Somos loucos. Somos Cruzeiro.

A dor faz parte. Mas a felicidade é muito maior. Quando se olha para o azul com as cinco estrela do Cruzeiro do Sul estampadas vê um time tão combatido, jamais vencido. Um time com inúmeras páginas heroicas e imortais.

O mais importante ali era que você se divertiu e aprendeu.

Hoje você é um cruzeirense melhor e eu sou um pai ainda mais orgulhoso. O ciclo da vida continua.


Foto: Facebook Cruzeiro


quarta-feira, 11 de outubro de 2017

O Título do Cruzeiro... Quinta Estrela! Quem vai perder?

Sabe quando você diz “Não perco isso nem a pau” ou “Nem se eu morrer eu deixo de ir”?

Bem, eu não falei nenhuma dessas duas expressões, mas fazem exatas duas semanas que o Cruzeiro se tornou pentacampeão da Copa do Brasil.

Arrumei ingresso, fiquei mais de duas semanas na expectativa da final, vi programas esportivos, li notícias e pensei como seria lindo o evento.

Na quarta-feira do jogo cheguei bem cedo ao escritório e trabalhei intensamente. Montei na moto e peguei o ingresso antes de ir para casa. Às 19h, eu e meu filho fomos juntos ao treino de taekwondo. Foi um ótimo treino, um dos melhores que já participei. Brinquei com um colega: “cuidado para não me bater forte porque daqui a pouco vou ao jogo”. Ele brincou de volta: “Agora é que vou bater mesmo”. E rimos nós dois.

Voltei para casa, tomei banho e escolhi com cuidado toda a roupa para o evento de gala. Tênis azul, meia branca, calça azul, cueca azul, camisa polo azul da Penalty apenas com as cinco estrelas mais lindas do mundo, que representam o Cruzeiro do Sul e o clube que está no meu coração desde sempre.
Pronto para ir ao jogo. Cruzeiro vai ser campeão

Jantei macarrão feito pela minha esposa Fernanda Matos. Ao me despedir e pegar o capacete, ouvi um “Cuidado para ver se não roubam essa moto lá”. Respondi: “Fique tranquila, vou devagar e chegando lá vou usar o cadeado. Como estou de moto, nem vou ficar preso no congestionamento”. Eram 20h32 quando abri o portão. Como moro relativamente perto do Mineirão, no máximo 21h15 eu estaria pronto para entrar no estádio. Fecho o portão e no coração vai a certeza: o Cruzeiro vai ser campeão.

Viro a esquina da minha rua e começo a descer. A rua é íngreme e nem tem como correr. Estou chegando ao primeiro cruzamento.

Pelos arrepiados, coração disparado, adrenalina alta, cabeça “a mil”. Já não é mais pelo jogo. Sei que o Cruzeiro vai ser campeão, que os foguetes iluminarão o céu de Belo Horizonte pouco mais de meia noite, que as carreatas invadirão a madrugada, que ano que vem o time estrelado estará na Libertadores, que os jornalistas usarão o termo “novo Rei de Copas”, que o azul será a cor predominante das ruas da cidade, que uma nova página heroica e imortal seria escrita.

Tudo aconteceria como eu tinha certeza em meu coração.

Mas menos de um segundo seria o tempo possível para eu não poder dizer “eu já sabia”. Em menos de um segundo eu poderia perder o ar, a voz, o fluxo, a cor e a vida.

Em segundos, os freios tiveram que ser acionados e os pelos arrepiados, coração disparado, adrenalina alta e a cabeça “a mil” já não eram pelo Cruzeiro. Era um ônibus azul que resolveu virar à esquerda de repente e de uma vez bem na minha frente.

Você já esteve em um acidente de moto? Já bateu de frente em uma parede? Ou já viu um acidentado de moto?

Ali entravam em jogo as leis da física, em que, mesmo abaixo da velocidade da via mas morro abaixo, os freios não seriam suficientes. Eu já havia pensado em escrever um livro em que seu início envolvia uma batida de moto. Eu escreveria apenas por achismo. Agora eu sei.

Pelas leis da física, talvez esse livro nunca fosse escrito. Afinal, se você já esteve em um acidente de moto, se já bateu de frente em uma parede ou já viu um acidentado de moto, você já deve imaginar eu morto ou pelo menos muito quebrado e desfigurado.

Mas existem os desvios divinos – ou delineações divinas. Existem anjos e existem livramentos. Existe o inexplicável e também o imponderável.

Lembram do “Não perco isso nem a pau” ou “Nem se eu morrer eu deixo de ir”?
Foto: Cristiane Mattos/Site Oficial do Cruzeiro

Bem, ao jogo não fui. O ingresso está dentro da carteira até hoje. Dentro da sala do raio-x eu ouvi minha esposa gritar “FÁBIO DEFENDEU!!!” e depois “O CRUZEIRO É CAMPEÃO!!!”. Ela que provavelmente nem assistiria ao jogo.

Aquela moto com logo da banda Rosa De Saron no para-lama dianteiro praticamente não existe mais. Nem um osso do meu corpo foi quebrado ou trincado. Dores no punho, na virilha e nos ombro eram suportáveis. Escoriações no punho, no antebraço e no ombro do lado direito eram marcas da vitória que provavelmente se eternizarão em cicatrizes. O Cruzeiro E. Clube tornou-se pentacampeão do Brasil.

Mas, mais importante, Deus provou mais uma vez que Ele existe.